Opinião

Dois pesos, duas medidas. Vereadores rejeitam aumento de 3,1% para servidores da CMJP

Vereadores de João Pessoa conseguiram estabelecer um grande paradoxo neste dia 30. Injetaram em seus subsídios uma dose financeira generosa: até 2022, reajuste de quase R$ 4 mil reais sob argumento de que era preciso repor as perdas dos últimos 8 anos. Fizeram o cálculo considerando o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2017 a 2019.

O curioso é que o projeto que propunha reajuste de apenas de 3,1% para os servidores da Câmara foi rejeitado na mesma sessão. O percentual, bem mais tímido que os 26,6% de aumento sobre os salários dos parlamentares, serviria para compensar a inflação do período. Não há justificativa. O que há são dois pesos e duas duas medidas e uma manobra mal feita para furar um bloqueio legal já que o reajuste deles havia sido anulado pela justiça.

Sabendo ilegal a correção até 31 de dezembro de 2021 porque proibida por Lei, a aprovaram agora para entrar em vigor só em 2022. A intenção é clara: burlar a legislação na tentativa de dar ao reajuste uma aparência de legalidade. São os fins justificando os meios. Fosse um livro, eu diria que estamos na trama de Lewis Caroll e que os vereadores pessoenses adotaram o conselho de Alice: “regras existem para serem quebradas”. Mas este não é o “País das Maravilhas” e não há graça neste conto.

Há ainda uma outra questão que precisa ser considerada. Vereadores aprovaram o próprio aumento como se fosse um Decreto legislativo e, portanto, de competência privativa da Câmara. Isso afastaria a necessidade de sanção do prefeito. O reajuste, porém, foi apresentado pela Mesa Diretoria como Projeto de lei, portanto, precisaria passar pelo Executivo. Há aí um erro de forma que pode levar à anulação do ato.

Outro ponto para reflexão. Vereadores se deram aumento e não anunciaram o tamanho do impacto que isso vai causar nas contas da Casa. Não publicamente. Mais uma vez, zero no quesito transparência e isso contraria o interesse público. A Folha de Pessoal da Câmara beira os R$ 4 milhões por mês sem contar com o reajuste. Se o duodécimo repassado pelo Município à CMJP é de R$ 5.921.677,90 por mês para bancar todas as despesas, há uma grande probabilidade de colapso nas contas.

Nem austeridade, nem compromisso. Vereadores usaram a última sessão do ano para medir forças com a sociedade, com o judiciário. Não bastasse as dificuldades de um ano particularmente duro em função da pandemia da Covid-19, lançaram mão de uma estratégia duvidosa: vencer o controle externo pelo cansaço.

O reajuste pode ser, mais uma vez, questionado na Justiça por meio de nova Ação Popular. Esse é o remédio que cabe a qualquer cidadão que queira questionar atos que considera lesivos ao patrimônio público e à moralidade administrativa.

Há esperança. Senão da parte de quem faz as leis, que venha de quem as reclama e as aplica.