Opinião

Os secretários (e os desafios) de Cícero III

Por Rejane Negreiros

“Ninguém governa sozinho”. O mantra é comum na política. Tem sido dito e repetido por tantos, comumente para justificar alianças que são tecidas em nome da governabilidade. Não há pecado nisso. Exceto quando, em nome das alianças, a gestão fica comprometida e os serviços públicos deixam de ser eficazes e de cumprir seu papel precípuo de servir à população para atender, exclusivamente, a interesses privados. Aí haverá conflito.

Não há como saber – ainda – como as mais diferentes pastas vão ser tocadas na gestão Cícero Lucena III. Por enquanto, o que se sabe é que, na distribuição das secretárias, apenas parte dos escolhidos têm capacidade técnica. Na ciência e tecnologia, por exemplo, Margareth Diniz, pesquisadora e ex-reitora da UFPB. Gostem ou não da professora, o cabedal de vida profissional dela será de grande valia para gestão.

Sabe-se, também, que para outras secretarias alguns caíram de paraquedas. O vereador Corujinha (PP), mesmo partido do Cícero, está nesse grupo. Assumiu a pasta da Cidadania e Direitos Humanos, parida com o desmembramento da Secretaria de Desenvolvimento Social. No lugar dele na Câmara, o suplente Mangueira (PP). Se o agora secretário entende do riscado, o tempo vai dizer. Não deixa, contudo, de ser um paradoxo.

Foi Corujinha que tocou de forma atropelada e com profundo assanhamento autoritário, nos últimos dias de 2020, a votação do projeto que reajustava os salários dos parlamentares de João Pessoa em 26,6%, mas engavetou o aumento de 3,1% para servidores da Câmara.  “Reajustava” porque foi vetado por Luciano Cartaxo no último ato como prefeito da capital. Todo o processo foi marcado pela falta de transparência e pelo atropelo à moralidade e legalidade. Estranho que o regente de tamanho desafino agora seja o maestro da Cidadania e Direitos Humanos. São os custos dos apoios de campanha, notas promissórias assinadas por Cícero lá atrás e honradas agora. A nomeação de Corujinha – e de outros – é o ônus do bônus.

Secretários definidos, Cícero Lucena terá um mandato de quatro anos (se não for reeleito) para executar as medidas que anunciou quando de sua posse. Algumas delas exigem grande articulação com governos estadual e federal. Para citar uma apenas: o combate ao déficit habitacional. Cícero quer construir “o maior programa de habitação que a cidade já viu”, disse.  Apesar de certas peças duvidosas na equipe, a experiência dele pode ser um trunfo importante na gestão. Saber o caminho das pedras, encurta distâncias – especialmente quando o objetivo é captar recursos para fazer investimentos.

Parceria com João Azevedo (Cidadania), governador da Paraíba, ele já destacou que terá. Por ser do Partido Progressistas e pelas amarras que tem com partidos do bloco conservador/neoliberal em Brasília – aqueles que são da base bolsonarista – pode ter menos dificuldades para furar bloqueios. Até já conseguiu R$ 47 milhões para o Turismo. Como o dinheiro vai ser investido é coisa a se acompanhar.

Aliás, tudo deve ser acompanhado com rigor, até porque os desafios não serão poucos. Cícero pega a prefeitura com dinheiro em caixa, mas cheia de necessidades – da saúde à infraestrutura –, e a lista de promessas é grande: melhorar a transparência, ampliar a cobertura dos Postos de Saúde (PSF), investir em tecnologia, requalificar o centro histórico, criar emprego etc.

A dívida com os dele – aqueles que integram o projeto que venceu nas urnas – já está sendo paga. Apenas duas Secretarias permanecem vagas (Orçamento Participativo e Transparência) e uns poucos cargos de relevo. Resta agora começar a quitar o débito com a população, e o prazo já está correndo.