Muito além de aliados

Nesta semana, Jair Bolsonaro (PL) fez uma rápida viagem à Europa. Primeiro se reuniu com o presidente russo Vladimir Putin e, em seguida, com o premier húngaro Victor Orbán. A versão do Palácio do Planalto é que o mandatário brasileiro foi tratar de acordos nas áreas de combustíveis, defesa e fertilizantes. Pura balela.

As parcerias econômicas entre os três países são pouco relevantes. A Rússia ocupa a 36ª posição no ranking das exportações brasileiras. Sem falar no insignificante intercâmbio comercial com a Hungria. Bolsonaro foi, na verdade, atrás da receita para se perpetuar no poder. E disso Putin e Orbán sabem bem.

Em 2018, Vladimir Putin garantiu seu quarto mandado de presidente da poderosa Rússia, ao obter 76% dos votos. Seu principal oponente, Alexei Navalny, não pôde concorrer. Ele estava preso, acusado de corrupção. Sem adversário de peso, a vitória de Putin foi acachapante. Uma grande coincidência com a eleição presidencial do Brasil, ocorrida no mesmo ano.

De perfil autoritário e nacionalista ferrenho, Putin está no poder desde 2000, quando foi eleito presidente pela primeira vez. Desde lá, vem alternando seu controle sobre o país: ora como primeiro-ministro, ora como presidente. Sempre com grande popularidade entre os russos, que nunca souberam o que vem a ser uma democracia liberal nos moldes ocidentais.

Vladimir Putin é advogado de formação e militar de profissão. Entrou para a KGB (a polícia política da antiga União Soviética) em 1975, chegando ao posto de tenente-coronel. Quando começou a derrocada do comunismo, saiu da KGB e mudou de lado: transformou-se num ácido crítico do socialismo. Em 1991, Putin abandonou a KGB e se converteu num político profissional.

Sua sagacidade política e habilidade em eliminar adversários lhe proporcionaram uma ascensão meteórica ao Kremlin. A anexação da Criméia em 2014 e o controle do segundo arsenal nuclear do planeta fizeram de Putin uma voz respeitada e temida no cenário internacional.

Sua atuação política não se restringiu à Rússia. Franco admirador de Donald Trump, Putin foi acusado de interferência na eleição presidencial norte-americana de 2016. De acordo com o serviço secreto americano, ordenou sistemáticos ataques cibernéticos nas redes sociais contra a candidata democrática Hillary Clinton. Dessa forma, favoreceu a eleição do oponente republicano. Como Bolsonaro, Putin sabe atuar nas sombras para alcançar seus objetivos.

Victor Orbán, o primeiro-ministro da Hungria, está no poder desde 2010. Líder nacionalista de extrema-direita, ele é considerado o símbolo maior da “democracia iliberal”, termo empregado para caracterizar regimes autoritários que encontram amplo respaldo no eleitorado. Orbán tem o mesmo perfil político de Bolsonaro: persegue minorias, vocifera contra os direitos humanos, ataca a imprensa e tenta desqualificar o poder judiciário.

Amargando baixos índices populares, enfrentando uma crise econômica e atrás de todos os outros candidatos competitivos, Bolsonaro busca desesperadamente a fórmula para ganhar a eleição presidencial a ser realizada em outubro. O que ele conversou no privado e acertou com os dois representantes da direita mundial dificilmente saberemos.
O fato é que Bolsonaro fará de tudo para permanecer no Palácio do Planalto e longe das garras da justiça, a mesma que fraquejou diante dos desmandos do presidente negacionista, mas poderá agir perante um ex-presidente que pouco fez pelo país a partir de 1º de janeiro de 2023.