Por que Genivaldo?

Genivaldo de Jesus era um homem simples. Negro, pobre, com pouca escolaridade, como grande parte dos brasileiros. Adorava a sua moto. Montava nela e saía por aí, sem capacete, como muitos, inclusive o próprio presidente Bolsonaro nas suas “motociatas”. Genivaldo tinha problemas psiquiátricos. Havia sido diagnosticado com esquizofrenia. De acordo com a declaração do seu sobrinho, ele tomava “remédio controlado para os nervos há vinte anos”. Assim como todos nós, Genivaldo de Jesus também sofreu com a pandemia, a falta de vacina, a inflação alta e desemprego. Como boa parte da população, estava passando por dificuldades.

No dia 25 de maio, Genivaldo circulava livremente pela BR-101, que corta a cidade de Umbaúba, no sul de Sergipe. Ele foi parado por 3 funcionários públicos, policiais integrantes da PRF, pagos com o dinheiro dos nossos impostos. Seu crime, guiar a moto sem capacete. Durante a ação, Genivaldo foi xingado, recebeu rasteiras e chutes. Ele ficou confuso com a truculência dos policiais, não entendia o que estava acontecendo, protestou. Nunca antes havia sido abordado daquele jeito. Negro e com roupas simples, Genivaldo foi o alvo perfeito do preconceito racial que grassa na nossa sociedade.

Para a elite econômica e seus agentes, todo preto e pobre é visto como um “elemento suspeito”, uma ameaça à sociedade. É o cruel reflexo do racismo estrutural que domina as instituições. Mesmo estando desarmado, os policiais consideraram Genivaldo um inimigo a ser abatido. Já imobilizado, os policiais decidiram colocá-lo dentro do porta-malas da viatura e jogar uma bomba de gás lacrimogêneo e spray de pimenta no interior do veículo. Aqui me permitam um depoimento pessoal. Quando fiz o curso de oficial do exército (NPOR), passei por um treinamento que consistia em atravessar rastejando, com uma mochila nas costas e um fuzil nas mãos, um túnel com gás lacrimogêneo. A sensação é a pior possível. Olhos ardendo, garganta fechada, dificuldade em respirar e sufocamento iminente. Ou você atravessava o túnel, ou morria asfixiado.

Voltemos ao caso do assassinato. Por seu atrevimento em questionar a ação truculenta, os policiais decidiram que Genivaldo deveria morrer. Preso dentro da câmara de gás improvisada, ele debateu-se inalando a fumaça tóxica, sem conseguir respirar. Seus urros de agonia e desespero são aterrorizantes e comoventes. Ainda ecoam na minha mente. Mesmo com o bárbaro crime, os policiais não devem ser mortos na câmara de gás, como assassinaram Genivaldo de Jesus. Eles devem ser presos, julgados e condenados pela justiça, como determina a lei. Assim se faz no estado democrático de direito.

A morte de Genivaldo de Jesus deve servir de alerta. O racismo estrutural que mata cotidianamente dezenas de jovens negros nas periferias das nossas cidades tem que ser combatido com leis rigorosas. Além disso, é urgente e necessário um profundo processo educacional que mude a cultura de violência que perdura no Brasil. Caso contrário, o racismo continuará a dizimar homens e mulheres pela simples razão de serem negros e pobres.