Saindo de um buraco e entrando em outro

Os dados que o IBGE apresentou na semana passada, mostram que “a economia está saindo do buraco.” Claro que isto foi motivo para o foguetório do governo. Não negando o fato que alguns dados são positivos, torna-se necessário analisá-los. As estatísticas as vezes enganam quando tratadas ideologicamente. Não restam dúvidas que os números mostram uma certa recuperação. Apesar de serem maus para o consumo do governo e para as exportações, os dados do crescimento da indústria, dos serviços, do emprego são positivos.

Para nós os números não surpreenderam. Há algumas semanas chamamos a atenção para o programa de bondades do governo e seu caráter eleitoreiro. O governo que, durante 3 anos nada fez para melhorar a situação do país, de repente, tornou-se bonzinho a ponto de tentar se apropriar do aumento do bolsa família para R$600, que ele combateu e tentou impedir. Lembramos que o “sinistro” da economia, Paulo Guedes, inicialmente sugeriu um auxílio de R$200 apenas para os trabalhadores informais e para os de carteira assinada a suspensão dos contratos de trabalho sem nenhuma remuneração. Todos iriam para casa empregados, mas sem salário. Foi derrotado pelo Congresso.

Já mostramos que a política econômica pode ter grande interferência nos movimentos da economia e o presente caso é um ótimo exemplo. O presidente, desesperado com os resultados das pesquisas eleitorais, e acossado pelas pressões internacionais que repudiam o golpe de estado, que ele tanto acalenta e continua a pregar, deixou cair a proposta neoliberal de austeridade fiscal e abriu os cofres para comprar os eleitores. Que se dane o orçamento e o déficit fiscal! Serão problemas, para depois de janeiro, a serem resolvidos pelo próximo governo. O resultado é o derrame de bilhões de reais na economia o que, sem dúvida, está provocando um aumento do consumo, da produção, do emprego, das atividades de modo geral.

É o que as estatísticas nos mostram e estamos assistindo. Mas, como diz o ditado português, “cá se fazem, cá se pagam”. Saudamos a queda no desemprego, mas com a criação de novos empregos precários, informais e com baixos salário. A informalidade bateu novos recordes e atualmente há 39 milhões e duzentos e noventa e quatro mil trabalhadores informais na população ocupada, sobretudo nos serviços, o que significa cerca de 40% desta população. Mas sabemos que a resposta da produção a um aumento do consumo repentino não é imediata. Estamos presenciando um forte desequilíbrio entre oferta e procura, pois a oferta de produtos não pode aumentar imediatamente para atender à pressão provocada por esta distribuição repentina de dinheiro. Uma empresa para aumentar sua produção necessita de novos equipamentos, mais matéria prima e mais trabalhadores, o que exige tempo. Como consequência temos um repique da inflação que atinge diferentemente as diversas classes de renda. Para os 10% mais pobres, que ganham entre 1 e 1,5 salários-mínimos, a inflação, em 12 meses até julho, foi de 7,8%, mas, a de alimentos, atingiu 16,19%. No entanto, para os 10% mais ricos, que ganham entre 11,6 e 33 salários-mínimos, a inflação caiu 1,05% e a de alimentos cresceu apenas 1,2%. Embora o “mercado” estime a continuação da queda da inflação, o próprio Banco Central (BC) através de seu presidente Roberto Campos Neto, admite que ela vai retornar com força e que o banco vai continuar a subir os juros de referência (a taxa Selic). O próprio presidente teme o fenômeno conhecido como “boca de jacaré”, em que as linhas do gráfico que representam os crescimentos da inflação e da economia se afastam. (Ele tem vergonha de chamar isto pelo nome: “estagflação”, o que significa inflação com estagnação da economia, fenômeno que não tem qualquer explicação na ideologia econômica oficial). Esta elevação da Selic já vem tendo consequências na inadimplência dos consumidores que foi acrescida de 4,6 milhões de pessoas. O total hoje já atinge 66,8 milhões de consumidores. De acordo com a Pesquisa Nacional de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), da Confederação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), 78% das famílias estão endividadas. O IPCA, que é o índice usado para medir a inflação, em agosto era de 9,68% e em setembro atingiu 10,25%, ou seja, chegou aos dois dígitos.

O sufoco da campanha política e as promessas descabidas nela feitas são de tal ordem que poucos prestam atenção nos absurdos que foram enviados ao Congresso na Proposta de Lei Orçamentária Anual (LOA) e na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). A continuação das bondades não está prevista pelo próprio governo a partir de dezembro quando o novo orçamento entrar em execução. O próprio Programa “Casa Verde e Amarela”, tão alardeado pelo governo, terá seus recursos reduzidos a 5% da dotação atual o que significará paralização de obras e não contratação de novas.

A partir de dezembro todas as bondades vão desparecer e restarão um orçamento inexequível e estourado e uma população desempregada, com baixos salários, inadimplente e faminta. Eis o resultado da economia saindo do buraco do “sinistro” Guedes e o que restará do outro Brasil para ser administrado pelo vencedor das eleições.

Antes de terminar convém lembrar que a situação internacional continua grave, a Organização Mundial do Comércio (OMC) prevê a desaceleração do comércio mundial, a inflação pressiona os preços e a recessão ronda todas as economias até dos EUA, que têm sido o grande ganhador ao vender petróleo e gás caros para a Europa e fazer sua guerra com os recursos monetários e humanos dos outros, além de ser longe de seu território.