Salve-se quem puder

O movimento da economia continua dentro do previsto. A recuperação mundial arraste-se travada pela nova onda da variante Ômicron e agora agravada pela crise provocada pelos EUA e seu novo presidente Biden, que busca arranjar um pretexto para reverter seu desprestígio interno. A crise da Ucrânia não interessa à Europa. Uma guerra seria em território europeu e não nos EUA que assistiriam à distância. Os russos estão furiosos com as provocações americanas que visam colocar a OTAN nas suas portas. Afinal eles já pagaram o preço de duas guerras mundiais em seu território além da invasão napoleônica em 1812 e outras aventuras japonesas, britânicas e francesas em vários momentos. Por isso a reação russa era esperada. Parece que as tensões começam a esfriar e sobrou para o Brasil a ameaça de ficar sem o potássio de Belarus que sofre sanções, o que prejudica nossa agricultura. Mas, certamente, estamos salvos com a gloriosa missão diplomática do Bolsonaro à Rússia que trará a paz, evitando a terceira guerra mundial. A visita tem sido fonte de memes e piadas generalizadas.

Além do caso Ucrânia há outras preocupações no panorama internacional. A China continua a desacelerar o que afeta a todos diante de sua importância. Ela é responsável por 15% do comércio mundial e 25% do crescimento global. A economia americana enfrenta a pior inflação desde 1982 com escassez de produtos e de mão de obra. O preço do petróleo continua a subir no mercado mundial impulsionando a inflação, que na zona do euro, chegou a 5,1% preocupando os Bacos Centrais. O Banco da Inglaterra já elevou os juros para 0,5% e o Banco Central Europeu (BCE), seguindo o Federal Reserv (Fed.), BC americano, programa também uma elevação. A consequência é a possível debandada dos capitais dos países emergentes, em busca de segurança, e particularmente do Brasil onde o governo prima pelo comportamento estúpido. Agora mesmo, na Organização Internacional do Trabalho (OIT) o país ficou isolado na companhia da Colômbia, opondo-se e não participando da comissão internacional que prepara uma proposta de reforma dos princípios da organização para uma “retomada centrada no humano” e criação de “condições de trabalho seguras e saudáveis”.

Mas, enquanto nosso presidente desempenha sua importante missão em defesa da paz mundial, por cá as coisas andam mal. Os indicadores observados são preocupantes. Além da ação nefasta da Ômicron, que continua a matar e encher os hospitais, o país tem de suportar a campanha dos bolso asnos contra a vacinação infantil e os protestos de grupos militares que recusam a vacinação.

A degradação do parque industrial agravou-se. Entre 2011 e 2021 a participação da indústria de transformação nas exportações alterou-se. A percentagem dos produtos manufaturados no total exportado que era de 56,5% caiu para 27,4%. Os semimanufaturados caíram de 14,1% para 13,2% enquanto os produtos básicos subiram de 26,3% para 59,4%. Isto mostra que, além de exportadores de produtos primários, nos apresentamos como possuidores de uma indústria de baixa tecnologia especializada em produtos semiacabados e com possiblidades de integração nos escalões inferiores das cadeias globais de produção.

O comércio também apresenta desaceleração. A queda foi apontada pelo Índice Getnet (Igetnet) calculado pela empresa Getnet e o banco Santander. Em janeiro o varejo ampliado caiu 5,7% sendo a oitava contração seguida. As vendas de móveis e eletrodomésticos caíram 42,6% e materiais de construção 23,6%. As vendas do setor de automóveis caíram 27,4% em relação a 2021. São as menores desde 2005.

Pelo lado do consumo a Pesquisa Nacional de Endividamento e Inadimplência de Consumidores (Peic) feita pela Confederação Nacional do Comercio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) apontou que 76,1% das famílias estão endividadas e a inadimplência é recorde. Por outro lado, a criação de empregos informais e de baixa remuneração fez a massa salarial no trimestre encerrado em novembro cair 1% seguindo tendência anterior.

Apesar deste quadro adverso o Banco Central (BC), continuando com sua insensata e fanática política, subiu a taxa Selic de 9,25% para 10,75% mesmo mantendo, para o ano, a meta de 3,25% com teto de 5%. O próprio BC, no entanto, estimou o estouro de sua meta prevendo uma inflação em 5,4%. Claro que esta elevação não terá nenhum efeito na inflação. Com os preços do petróleo ultrapassando a marca dos US$ 90 por barril, e com a tendência a subir ainda mais, e com um dólar que já salta a fronteira dos R$5,32 os preços dos derivados continuarão a subir, graças à política de paridade internacional (PPI) praticada pela Petrobrás e que será mantida. Segundo palavras de seu presidente, general Joaquim Silva e Luna, esta política visa “… dar oportunidade para que outros importadores participem do mercado, ao praticar um preço competitivo”. Por incrível que pareça, temos um capitalista que eleva seus preços para criar artificialmente uma concorrência incompetente que não consegue competir se as regras do mercado forem mantidas. Que empresário é este? Pelo que sabemos os capitalistas querem liquidar os concorrentes e não os criar. Este general de pijama o que pretende é aumentar os lucros da Petrobras para distribuir dividendos aos sócios privados e enriquecer os concorrentes que ele pretende criar e engordar. Os interesses do sócio majoritário, que é o governo e, portanto, o povo, e que em qualquer Sociedade Anônima deveriam prevalecer, são relegados ao segundo plano.

Se a economia não ajuda, o ambiente político continua a deteriorar-se com a certeza da derrota do Bolsonaro se espalhando no congresso. As ratazanas já ensaiam o abandono do barco. No governo, os ministros e auxiliares digladiam-se cavando sua própria eleição e disputando o apoio do chefe. Se não havia comando antes, agora o caos aumentou. Na abertura das atividades legislativas o pega tornou-se visível. Bolsonaro, com sua costumeira grosseria, aproveitou a oportunidade para atacar os tribunais superiores e o Lula enquanto Pacheco (presidente do senado) enviou recados ao próprio presidente criticando os ataques à democracia, às eleições e às instituições e denunciando as fake News. Já o Lira (presidente da câmara) mandou indiretas ao Pacheco culpando-o pela lentidão no andamento de projetos já aprovados na câmara.

E enquanto as rusgas se generalizam o governo manda sua base derrubar os vetos que ele próprio assinou, a casa civil prepara projetos de leis secretos que seus ministérios não quiseram elaborar, Bolsonaro desrespeita e combate instruções emanadas dos seus próprios ministros.

Na casa da mãe Joana instala-se o salve-se quem puder enquanto o país vai para o brejo com todos nós.