Uma branca, um negro e o chicote

A cena é de revirar o estômago. Uma mulher branca chicoteia um homem negro com uma corda de amarrar cachorro. Não é uma imagem do Brasil escravagista pintada pelo francês Jean-Baptiste Debret. É o retrato explícito do racismo no Brasil do século 21.

O fato ocorreu no bairro de Laranjeiras, um dos mais caros do Rio de Janeiro, onde a maioria dos habitantes tem renda alta e pele clara. A mulher branca é a ex-atleta de vôlei e nutricionista Sandra Mathias Correia de Sá. O homem negro é o entregador por aplicativo Max Ângelo dos Santos. Ele tem 36 anos e três filhos.

A mulher branca trabalha na praia. Tem uma escolinha de vôlei à beira-mar. Ou tinha até a prefeitura retirar sua licença. O homem negro mora na favela da Rocinha e pedala até 12 horas por dia entregando comida na zona nobre.

Sandra despreza os negros. Traz na sua personalidade o ódio dos seus ancestrais brancos, quando os pretos escravizados eram vendidos no mercado do Valongo como animais. No longo período de escravidão, assim que eles desciam do navio negreiro eram brutalmente espancados pelos comerciantes de escravos para os humilhar e demonstrar quem realmente mandava.

Incomodada com a presença de um negro no “seu” bairro de elite, Sandra ofende Max, cospe nele, vocifera e o agride, na honra e no corpo. Ela grita que ele deveria voltar para a favela. Sandra acredita que ainda está na Casa-Grande e quer que Max volte para a Senzala. Ela não o respeita como ser humano, trabalhador e pai de família. Para Sandra, Max é inferior ao seu cão, de quem retirou a guia para o espancar.

O sistema escravista brasileiro acabou oficialmente em 1888. Mas a mentalidade escravocrata permanece dominando a mente e o comportamento de muitos brasileiros. Sandra é um exemplo de que temos muito ainda que avançar no longo processo civilizatório.

Cadeia é pouco para Sandra que ainda pensa ser a sinhazinha.