O chavismo tupiniquim e o risco à economia

Já abordei o fato de que o principal pecado cometido pelo presidente Jair Bolsonaro foi não ter adotado, exatamente, a pauta liberal através da qual fortaleceu sua candidatura e em torno da qual a direita se uniu contra os desmandos cometidos pelos seus antecessores nos quatorze anos anteriores.

Superada a fase de acreditar que o atual governo será capaz de deixar algum legado em torno de elevar a condição da economia brasileira a um patamar razoável, que honraria seu potencial de produzir riquezas e de inserir, de forma intensiva, no sistema de trocas internacionais, gerando divisas suficientes a estimular, num ciclo virtuoso, o desenvolvimento econômico nacional, devemos entender quão perto estamos de implantar uma republiqueta golpista ao modo chavismo de ser.

Isso fica muito claro com o avanço da CPI da pandemia, em que fica claro que o capitão entupiu o aparelho burocrático estatal de militares, muitos dos quais demonstram total incapacidade de exercer os cargos que ocupam – ou ocuparam – numa clara semelhança, e não à toa, com o que praticou o militar Hugo Chávez, na Venezuela, nos anos em que exerceu o cargo de presidente daquele país, entre os anos de 1999 a 2013, quando veio a falecer.

Mas as aparências não terminam por aí. Acossado pela explosão de denúncias de corrupção que vêm à tona nas audiências da CPI no Senado, o capitão se utiliza da máxima de que “a melhor defesa é o ataque”, passando a tentar desqualificar os trabalhos parlamentares e bravatear sobre um possível golpe que se arma contra ele no impeachment- que ate agora é mera especulação – que hoje uma parcela razoável da sociedade brasileira defende, incluindo muitos daqueles que nele votaram em 2018.

Ora, ele mesmo foi um dos mais ardorosos defensores do afastamento da presidente Dilma Roussef, em 2016, motivado pelo que ficou denominado de “pedaladas fiscais”, que, diga-se de passagem, são meras incongruências contábeis diante das gravíssimas denúncias de corrupção na compra de vacina, como tem se visto através das sessões do Senado.

Mas, o mais grave de tudo é que a mera ordem de prisão dada pelo senador Omar Aziz para um simples burocrata da estrutura governamental do Ministério da Saúde – pego em flagrante delito pelo crime de perjúrio – deu pano para as mangas para que os comandantes das Forças Armadas passassem a intimidar o Senado Federal, numa clara alusão a que o golpe militar é uma opção factível, assim como aconteceu na Venezuela, que conviveu com 14 anos de presidência chavista. Foi o que aconteceu com a nota publicada em 8 de julho.

E as coincidências entre os dois governos devem se amontoar. O que se sucedeu à presidência de Hugo Chávez, todos sabem. Baseado numa economia sustentada numa commodity – petróleo – a Venezuela viveu o isolamento, sendo apenas amparada pelo parcial apoio russo, e mais parcial ainda, chinês, que foram insuficientes para livrar aquele país do mergulho em queda livre numa tragédia humanitária jamais vista naquele país.

Os nossos militares, assim como os venezuelanos, de acordo com os movimentos mais recentes, se insinuam para a solução mais bizarra, ameaçando uma democracia que ainda se consolida, mas que, até aqui, jamais foi tocada desde sua ressureição em 1985. O problema é que, diferente das ditaduras instaladas na América do Sul, nos anos 60-70, o Brasil, da mesma maneira que a Venezuela, vive um isolamento diplomático e, dificilmente, contará com o apoio dos Estados Unidos, assim como aconteceu em 64.

Restará, portanto, muito provavelmente, ao Brasil, dessa aventura golpista, bizarra e odienta, um país aprofundado numa crise social sem precedentes – as ruas apinhadas de mendigos nos mostram isso – e numa fuga de capitais jamais experimentada. A instabilidade política e a ruptura institucional causam caos e o caos é o pior cenário para os negócios, o que significa dizer que o golpe, já engedrado nos gabinetes palacianos, ameaça sobremaneira a retomada do crescimento econômico brasileiro no pós-pandemia.

Resta a torcida para que a iniciativa seja barrada porque, mesmo para os incautos que defendem o movimento, as ditaduras são cruéis, corruptas e desumanas. Nesse cenário, é preferível a pior democracia – e talvez a nossa seja representativa dessa – do que a melhor ditadura, se é que é possível falar em boa ditadura.