Opinião

Terceira via é malabarismo retórico

A ideia de uma terceira via na corrida à presidência da República vai ganhando personagens: direto do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM) e Simone Tebet (MDB). O PSDB avalia o cenário e João Dória, governador de São Paulo, vem manifestando interesse. Cabe aqui uma observação: nem dentro do ninho tucano há unidade. Eduardo Leito, governador do Rio Grande do Sul, também se anima. Tem até uma chapa MM, com Moro e Mourão sendo cogitados em Brasília. Desde que Lula se tornou um candidato viável, com a anulação das condenações referentes à Lava Jato, partidos de direita (o que engloba o famoso Centrão) se assanham na tentativa de buscar uma candidatura viável capaz de fazer frente a Lula e Bolsonaro. O velho Ciro Gomes (PDT) de guerra também procura se capitalizar por meio do discurso bélico. Esse cardápio não se esgota aqui. Outros nomes podem e devem surgir e é bom que se diga: não há mal nenhum nisso. A competição e a oposição política são dimensões legítimas de uma democracia.

Há duas coisas a considerar, no entanto. A primeira diz respeito ao sistema político brasileiro que é dual. Logo, a polarização é parte do processo. Além disso, a polarização no sistema político é apenas reflexo de uma polarização que existe sociedade. Para que ela não existisse seria necessário um Centro muito forte como eixo gravitacional para construir consensos. Sem consensos, há disputas e o governo sempre ocupará um dos pólos. Polarizará quem tiver mais força na oposição. Além do mais, o modelo adotado no país leva à possibilidade de segundo turno nas disputas para o Executivo, ou seja, à polarização . A segunda questão diz respeito à falsa simetria entre Lula e Bolsonaro. São oponentes, sim. Mas não representam dois extremos. Um é de centro-esquerda, trabalha na construção de alianças e respeito às regras do jogo. O outro, de extrema-direita, promove tensão, vive do conflito e de assanhos autoritários. Não é difícil diferenciar uma figura da outra, as características de cada um, basta aos que ajudam a sustentar essa conversa fiada de que ambos são a representação do extremismo um pouquinho de honestidade intelectual.

Dito isto, voltemos à terceira via. As peças anunciadas não representam em si mesmas qualquer novidade e integram o elenco de agentes responsáveis pelo processo de esfacelamento social e político que levou à eleição de Bolsonaro. Elas não só ajudaram a fermentar a negação da própria política como também contribuíram com uma agenda econômica austera e indutora de um estado mínimo que, sabidamente, geraria mais desigualdades e probreza. Até agora, a alternativa posta é voltar uma casa no tabuleiro, na era pré-Bolsonaro e pós-Dilma, ou seja, na era Temer, quando o Brasil teve o pior crescimento dos últimos 100 anos mas fez as reformas que o mercado exigia. Período controverso assim como a chamada terceira via que vende o velho como novo em um malabaristmo retórico pouco criativo e enfadonho.

E quais as chances da terceira via? Por hora, remotas. Seu crescimento depende da desidratação de uma das forças já postas. Seria preciso conquistar um desses espaços, mas falta espaço pra isso. Pelas pesquisas, Lula já ocupa um dos polos com chances reais de vitória e Bolsonaro tem 1/3 do eleitorado garantido e com margem de crescimento.  Enquanto tiver o Centrão, vacinação e atividades econômicas avançando, Bolsonaro se garante apesar da CPI da Covid e de sua rejeição crescente. Resumo da ópera: à terceira via falta musculatura para anular Lula ou Bolsonaro. Gostem ou não, 2022 já tem seus protagonistas. Por fim, cabe perguntar: quem defende a terceira via em 2022 votou em quem em 2018?