Opinião

‘A cara da Democracia’: pesquisa traz níveis de confiança dos eleitores nas Instituições

Na última terça-feira (12) trouxemos dados da nova edição da pesquisa “A cara da Democracia”, do Instituto da Democracia. Dos 2.558 eleitores ouvidos em 167 cidades brasileiras dos dias 22 a 29 de agosto, 82% reprovaram veementemente os ataques golpistas protagonizados por militantes bolsonaristas que invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes, em Brasília, dia 8 de janeiro.

Um dado relevante trazido pela pesquisa e pelo Blog: cerca de 43% da população apontam Jair Bolsonaro ou grupos extremistas de direita como responsável ou principais responsáveis pelos ataques, o que indica que uma parcela substancial da população associa diretamente o ex-presidente e sua retórica incendiária aos ataques antidemocráticos.

Fato novo: a pesquisa mostra ainda que 17% dos entrevistados não identificam ou associam os ataques aos bolsonaristas, e revela um apoio, ainda que marginal, aos atos golpistas por parte de 11% da população, percentual que se aproxima da base de apoio do ex-presidente e que sugere a existência de um segmento da sociedade que, embora não apoie explicitamente o golpe, também não o condena: um retrato da radicalização política no Brasil.

Mesmo tendo resistido às tentativas de golpe mostrando toda sua resiliência, a democracia brasileira tem um enorme desafio pela frente, que passa pelo rompimento com nossa tradição autoritária e pelo fortalecimento de práticas que envolvem participação e inclusão social. Compreender a essência dos atos golpistas e quem esteve por trás deles é um avanço, que não é definitivo porque democracias não estão blindadas e podem retroceder ou morrer. Vigiar é preciso.

Outros dados da pesquisa

O levantamento do Instituto da Democracia traz a avaliação por parte dos eleitores das instituições. Em relação às forças armadas, a confiança da população recuou no último ano. 20% disseram “confiar muito” nos militares. Em setembro do ano passado eram 27%. Queda de sete pontos percentuais. A taxa dos confiam mais ou menos variou de 30% para 33% no período, ao passo que os que declaram não confiar “nem um pouco” foi de 26% para 30%.

O nível de confiança nos partidos políticos é crítico, mas o cenário é melhor que nos anos anteriores. Confiam muito 6%. Em 2018, auge do bolsonarismo e da criminalização da politica, esse percentual era de 1%. Os que confiam mais ou menos somam 27%. Confiam pouco: 19%. Não confiam: 48%. Em 18, o percentual era de 78%. Houve uma melhora de trinta pontos percentuais nesse quesito, mas os números, como um retrato que são, demonstram que partidos políticos precisam repensar suas estratégias para se aproximar da sociedade. Um dos caminhos passa pela desburocratização.

Quanto ao Congresso Nacional, o nível de confiança melhorou mas ainda é baixo: 39% não confiam. Os que confiam mais ou menos somam 31%. Confiam pouco: 15%. Representam 14% os que confiam muito. Quanto ao Supremo Tribunal Federal, os números são os seguintes: 36% não confiam; 31% confiam mais ou menos; 15% confiam pouco; 14% confiam muito. Os ataques orquestrados à Suprema Corte e aos seus ministros por meio da milícia digital bolsonarista foram estratégia para manchar a reputação do ministros e minar a credibilidade do STF.

A Pesquisa também quis saber o que os eleitores pensam da Justiça Eleitoral. As respostas mostram que o bombardeio às urnas eletrônicas promovido por Jair Bolsonaro e extremistas de direita foi determinante para minar a confiança de fatia considerável deles: 31% disseram que não confiam; 30% confiam mais ou menos; 25% confiam muito e 14% confiam pouco.

Vamos ao último item avaliado: a confiança dos eleitores nas igrejas. Neste quesito há uma inversão: 42% confiam muito; 26% confiam mais ou menos; 19% não confiam e 11% confiam pouco. Esse é um termômetro que explica a explosão da pauta moral e do neoconservadorismo determinantes nas eleições presidenciais de 2018 e cujo papel foi o de tensionar ainda mais o cenário já radicalizado e promover um estado de intolerância completamente avesso ao estado democrático que, por natureza, é diverso e permite a cada um a livre manifestação de pensamento político e religioso.

Em um estado democrático cada um tem o direito de professar sua fé, mas questões religiosas devem ser manifestações de foro íntimo. Preocupa quando o discurso religioso, especialmente o que traz o verniz da intolerância, determina e contamina decisões políticas/judiciais e o resultado de eleições. Isso fere a laicidade do estado e sua obrigação constitucional de tratar a todos sem distinção de credo, de sexo, raça e convicções políticas. A fé de uns não pode ser justificativa para a perseguição de outros, e essa nem deveria ser uma questão de legalidade, mas de humanidade.