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Vereadora Raíssa Lacerda articulava com chefe de facção para barrar campanhas rivais, apontam investigações

A vereadora Raíssa Lacerda, do PSB, presa nesta quinta-feira (19) sob suspeita de articular com uma facção criminosa, agia, segundo apontam as investigações, para impedir que outros candidatos realizassem campanhas em áreas dominadas pelo grupo no bairro Alto do Mateus, em João Pessoa. A ação da Polícia Federal apura  o uso de violência e coação para angariar votos e revel uma trama que envolvia apoio de traficantes e a garantia de domínio territorial em troca de benefícios.

Raíssa Lacerda é acusada de liderar o esquema de aliciamento eleitoral que utilizava métodos ilegais e intimidatórios para pressionar moradores de determinados bairros a votarem nela. A investigação aponta que a funcionária pública Kaline Neres Rodrigues atuava como intermediária entre a vereadora e David Sena de Oliveira, conhecido como “Cabeça”, apontado como gerente do tráfico de drogas na região.

Conversas revelam articulação entre facção e campanha de Raíssa

Analisando o celular da vereadora, a Polícia Federal encontrou trocas de mensagens entre Kaline Rodrigues e o traficante David Sena, em que a funcionária solicita ajuda para garantir que apenas Raíssa Lacerda pudesse fazer campanha no bairro. Em uma das mensagens de áudio, Kaline pede que o traficante impeça a entrada de uma candidata rival, mencionando uma desavença política das eleições de 2020. “Como é que a gente faz para ela não pisar mais aí? Sem sujar muito para a Gestão”, questiona Kaline.

Em resposta, David Sena sinaliza interesse em colaborar, pedindo em troca algum meio de ganhar dinheiro durante o período eleitoral. “Vamos ver alguma coisa para nós arrumar uns votos e uma grana boa”, afirmou o líder da facção, sugerindo que o controle do bairro seria garantido em favor de Raíssa.

Tráfico e política: promessas de favores públicos

A investigação detalha que, em contrapartida, Kaline prometia facilitar o acesso a bens públicos, como o aluguel de carros pelo município e cargos para pessoas ligadas ao traficante. “Raíssa precisa desses votos para continuar e o futuro de vocês depende disso”, teria dito Kaline em uma das conversas, referindo-se à necessidade de manter a vereadora em posição de poder.

As conversas mostram que a vereadora recebeu os áudios trocados entre Kaline e David, orientando que a funcionária informasse o traficante sobre o apoio de uma liderança ainda mais poderosa de outra facção. Essa estratégia, segundo a Polícia Federal, tinha como objetivo reforçar a garantia de votos nas áreas sob controle do tráfico.

Coação e controle territorial

Nas conversas, o traficante David Sena reafirma o controle sobre o bairro Alto do Mateus e promete que impediria a ação da candidata rival. “No dia que ela descer e eu tiver aqui, ela não desce mais. Vou chamar a atenção dela de um jeito sem sujar para ninguém”, afirmou, garantindo que resolveria a situação sem gerar suspeitas que pudessem prejudicar a operação.

A Polícia Federal afirma que o objetivo final era coagir eleitores a votar em Raíssa Lacerda por meio do controle territorial e da pressão exercida pela facção. Kaline, por sua vez, deixava claro que tanto ela quanto a vereadora tinham plena consciência de que estavam lidando com um traficante, aproveitando-se do domínio da organização criminosa sobre a area.

Operação Território Livre e prisões

A prisão de Raíssa Lacerda é parte da operação “Território Livre”, que visa combater o aliciamento eleitoral e a influência de facções criminosas em campanhas políticas. Além da vereadora, foram presos Kaline Neres Rodrigues, Pollyanna Monteiro Dantas dos Santos e Taciana Batista do Nascimento, todas ligadas ao esquema de coação eleitoral.

A operação também revelou a conexão de Raíssa com a facção “Nova Okaida”, que domina partes de João Pessoa. David Sena de Oliveira, gerente do tráfico no Alto do Mateus, teve um mandado de prisão expedido, mas permanece foragido.

Repercussão e defesa

Os advogados das envolvidas já se manifestaram. A defesa de Kaline Neres afirma que não há provas concretas que incriminem sua cliente e entrou com um pedido de habeas corpus. Pollyanna Monteiro e Taciana Batista, também presas, negam qualquer envolvimento ilícito, segundo seus advogados, que alegam colaboração com a Justiça e consideram as prisões desnecessárias.

Raíssa Lacerda, que assumiu a vaga na Câmara Municipal após a morte do vereador Professor Gabriel, foi presa dois dias antes da proibição de prisões de candidatos no período eleitoral. A defesa da vereadora ainda não se pronunciou oficialmente.