América Latina: onda à esquerda
As eleições presidências realizadas na América Latina entre 2019 e 2021 demonstraram uma tendência de mudança radical nos governos. Em 11 dos 12 processos eleitorais que ocorreram nesse período, os eleitores apearam do poder o partido governante. Apenas em um país, Nicarágua, o presidente Daniel Ortega foi reconduzido à presidência, ao ganhar a quarta eleição presidencial consecutiva.
Outro fator que chama a atenção é a guinada à esquerda que vem varrendo o continente. Nas últimas eleições presidenciais, integrantes de partidos de esquerda foram consagrados nas urnas, desbancando candidatos conservadores. São os seguintes países que optaram por presidentes esquerdistas: México (Manoel López Obrador), Argentina (Alberto Fernádez) Peru (Pedro Castillo), Bolívia (Luis Arce), Chile (Gabriel Boroc) e Honduras (Xiomara Castro). É o prenúncio de um novo ciclo de governos socialistas.
Em 2022, mais três países latino-americanos passarão por eleição presidencial: Colômbia, Brasil e Costa Rica. Em todos eles, candidatos de esquerda e centro-esquerda ameaçam desbancar os atuais presidentes e seus representantes de direita e centro-direita.
As razões pelo descontentamento com os governantes de direita – derrotados recentemente e os atuais -, são muitas, cabendo destaque para o aumento da desigualdade social, a crise do desemprego e a epidemia de Covid-19. O eleitor médio, insatisfeito com sua precária condição de vida, está optando pelos candidatos de esquerda, que apontam para uma maior distribuição de renda, mais segurança e melhor atendimento nos serviços de educação e saúde.
Nas maiores economias do continente depois do Brasil, que eram administradas por presidentes de direita, México (Enrique Nieto), Argentina (Mauricio Macri), Chile (Sebatián Piñera) e Peru (Francisco Sagasti), as promessas de inclusão social e combate à corrupção fracassaram rotundamente, criando um clima de antigoverno que se espalhou por outros países, fortalecendo candidatos oposicionistas mais a esquerda.
No Brasil e Colômbia a situação não é diferente. O desgoverno Bolsonaro corre sério risco de perder a eleição presidencial que se aproxima. Quanto a Ivan Duque, presidente colombiano, sua rejeição por parte da população é uma das mais altas da história daquele país.
As elites latino-americanas não desejam a participação popular, são antidemocráticas por essência. Temem a ascensão das classes trabalhadoras e não querem a diminuição da concentração de renda. Sempre de plantão para servir às classes dominantes, os militares latino-americanos apelaram para golpes de Estado. Os generais brasileiros derrubaram um governo democrático em 1964 e inauguram um ciclo de violentas ditaduras militares. Os golpes se sucederam: Chile (1973), Uruguai (1973), Argentina (1976). Prisões, torturas e mortes formaram o cotidiano daqueles que pensavam diferente das elites e seus guardiões.
A partir da década de 1980, a América Latina viu os regimes militares ruírem em consequência da crise econômica, explosão inflacionária, corrupção, repressão política e crimes praticados por seus governantes. Humilhados, os militares retornam aos quartéis e deixaram os respectivos países em escombros. O continente voltou a conviver com a democracia. Mas as elites que controlam os governos não alteraram o modelo econômico existente. A maioria do povo continuou excluída dos direitos sociais básicos: emprego, moradia, educação, saúde e segurança.
A América Latina chegou ao século XXI assolada por uma crise social sem precedentes. Os desafios para os novos governantes de esquerda são enormes. A concentração de renda continua a crescer, boa parte da mão de obra vive na informalidade e a violência continua em expansão. Quanto às forças conservadoras, defenestradas do poder, continuam na espreita, conspirando para que os governos socialistas fracassem para assim poderem voltar, dando seguimento ao fatídico círculo de avanços e recuos políticos que têm marcado a nossa história.