Brizola: o último caudilho

Se ainda fosse vivo, Brizola completaria 100 anos neste 22 de janeiro. Nascido em Cruzinha, no Rio Grande do Sul, a mesma região de fronteira que gerou Getúlio Vargas e João Goulart, Leonel de Moura Brizola foi o último dos caudilhos latino-americanos de perfil político nacionalista e anti-imperialista.

Ainda menino, mudou-se para Porto Alegre, a fim de continuar seus estudos. De origem pobre, Brizola foi engraxate, graxeiro na Refinaria Brasileira de Óleos e Graxas, ascensorista e funcionário público. Diferentemente de outros políticos gaúchos que enveredaram pela carreira jurídica, ele optou pelo curso de engenharia civil. Mas, em vez de construir prédios, ele se dedicou a construir sonhos.
A sua maior paixão sempre foi a política.

Começou a militância partidária na universidade, a partir de 1945, período da redemocratização do Brasil. Tendo como referência Getúlio Vargas, Brizola ingressou no Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Sua função era organizar a ala jovem trabalhista. Dotado de uma retórica inflamada e grande poder de organização, Brizola ascendeu rapidamente no âmbito estadual.

Em 1947, foi eleito deputado estadual. Em 1950, Brizola casou-se com Neusa Goulart, irmã de João Goulart, aproximando-o definitivamente do futuro presidente. Em 1954, foi eleito deputado federal. Dois anos depois, elegeu-se prefeito de Porto Alegre. Em 1958, consagrou-se nas urnas e assumiu o governo do estado. Durante seu mandato, nacionalizou empresas norte-americanas, garantiu financiamento para empresas nacionais e realizou um programa de reforma agrária. Seu nacionalismo incomodou o governo de Washington.

Brizola não foi um político que lutou apenas com palavras e ações, mas também com armas. Em 1961, quando Jânio Quadros renunciou à presidência e os militares queriam impedir a posse do vice João Goulart, o então governador Brizola estruturou a “Rede da Legalidade”, distribuiu armas com civis e se aquartelou no palácio Piratini, ameaçado de bombardeio pelos golpistas. Por pouco o país não mergulhou numa guerra civil. Sua ação foi em parte vitoriosa. Goulart retornou ao país e assumiu a presidência, mesmo enfraquecida pelo parlamentarismo, regime político de curta duração.

Sua defesa corajosa e eficaz da democracia o projetou nacionalmente, ao mesmo tempo em que atraiu para si o ódio das forças reacionárias. Almejando ser candidato a presidente em 1965, Brizola transferiu seu domicílio eleitoral para o estado da Guanabara. Mas os militares deram o golpe em 1º de abril de 1964. Mesmo disposto a resistir, Brizola foi obrigado pelas circunstâncias a partir para o exílio no Uruguai, só retornando ao país em 1979, quando foi aprovada a anistia política.

Ao voltar ao Brasil, Brizola retomou sua luta política. Fundou o Partido Democrático Brasileiro (PDT), ganhou a eleição para governador do Rio de Janeiro em 1982 e implantou, junto com Darcy Ribeiro, o programa educacional mais arrojado que o país já teve: os Centros Integrados de Educação Pública (CIEPS). Em 1984, Brizola engajou-se na campanha Diretas Já, retomando sua retórica nacionalista e almejando assumir o Palácio do Planalto.

Na eleição presidencial de 1989, Leonel Brizola ficou em terceiro lugar. Outro líder popular, nascido das lutas sindicais do ABC paulista, assumira a posição de liderança carismática e nacionalista de esquerda: Luís Inácio Lula da Silva. Mesmo derrotado nas urnas, Lula passaria a representar as forças democráticas e progressistas que emergiram na redemocratização. Brizola representava uma outra era, com outras pautas, mas os dois se encontraram na encruzilhada da história: ambos em defesa de um projeto nacional de desenvolvimento com a inclusão dos menos favorecidos.

Brizola ainda viveria muitos anos, com força e personalidade política, mas em declínio. Voltou ao governo do Rio de Janeiro em 1990. Em 1994, concorreu novamente a presidente. Desta vez, seu desempenho eleitoral foi pífio. Amargou o quinto lugar, obtendo apenas 3,18% dos votos. O descenso político ficou evidente. Sua projeção nacional estava ofuscada por equívocos administrativos e atitudes políticas que o distanciaram de Lula, a liderança de esquerda em ascensão.

Brizola faleceu em 21 de junho de 2004. Mas a luta em defesa dos interesses nacionais continua a sensibilizar milhões de brasileiros.