Cor e preconceito

“O Brasil é uma democracia racial”. Essa frase, repetida diariamente no país, esconde o profundo preconceito de cor que nos assola. A democracia racial é um mito histórico, forjado pela elite branca, que tem que ser desmascarado por todos nós, independente da nossa cor.

Em pesquisa realizada pelo IBGE, em 2019, ficou constatado que os negros ganham 45% a menos do que os brancos. Entre os brancos e negros que têm curso superior, a diferença salarial é 31% maior para as pessoas de pele branca. Os dados revelam que a discrepância não é resultado apenas da diferença na escolaridade. O principal problema é o racismo estrutural entranhado no cotidiano.

O Brasil surgiu sobre o signo do preconceito racial. Assim que os portugueses desembarcaram no Brasil, em 1500, se depararam com dezenas de povos que habitavam o litoral e se espalhavam pelo vasto interior. Para justificar a exploração dessa população, os indígenas foram classificados como povos “sem fé, sem lei e sem rei”.

Com a dizimação de milhares de índios em consequência das guerras de resistência, trabalhos forçados e epidemias devastadoras trazidas pelos europeus, a mão de obra indígena começou a escassear. Para suprir as fazendas, os portugueses trouxeram milhões de africanos, escravizados pela cor da pele.

Em 1888, depois de 388 anos explorando o trabalho escravo, a Lei Áurea foi assinada. O Brasil foi o último país das Américas a acabar com a escravidão. Com a “libertação”, milhares de negros foram abandonados à própria sorte. A maioria permaneceu nas fazendas, trabalhando em condições similares à escravidão, em troca de comida e trapos.

Na primeira metade do século XX, por força e atuação da população negra, a contribuição da cultura africana passou a ser considerada relevante para a afirmação de uma nacionalidade brasileira. A culinária, a música e a religiosidade passaram a ser estudadas por acadêmicos no Brasil e no exterior.

Ao mesmo tempo, começou a ser a elaborado o mito da democracia racial. Esse mito tem como base a explicação de que o Brasil é um país mestiço, resultado da miscigenação de três culturas – indígena, europeia, africana –, e que, com essa fusão, não existiria preconceito racial nem discriminação de cor no país.

O mito da democracia racial, propagado por vários intelectuais, entre eles Gilberto Freyre, permanece até hoje enraizado fortemente na sociedade brasileira. Ele encontra-se disseminado por todas as classes sociais, servindo de alicerce para o racismo estrutural existente.

A “democracia racial”, alardeada por muitos, é um mito que precisa ser desmistificado. Enquanto perdurar o preconceito racial, enquanto forem mantidas práticas discriminatórias com a população negra, não avançaremos na consolidação de uma real e efetiva democracia social no Brasil, para todos: independente da sua cor da pele.