Violência psicológica contra a mulher agora é crime
Pedro e Camila formavam um lindo casal. Eram jovens, exibiam fotos de viagens e momentos românticos nas redes sociais, mútuas declarações e receitas de “como serem felizes a dois”. Mas os amigos mais chegados já haviam notado que, na intimidade, Pedro, vez por outra, tinha um comportamento desrespeitoso com Camila.
“Cala a boca! Você não entende de política!”
“Ela é meio lerdinha mesmo! Demora a entender as coisas…”
“Fecha esse botão! Quer mostrar os peitos para quem?”
“Você não precisa de ninguém além de mim! “Amigo de verdade, só eu!”
“Essa sua carreira não tem futuro! E você é muito ruim!”
“Eu me irrito, mas a culpa é sua! Você me tira do sério!”
“Se você me desafiar, vai ver o que acontece!”
“Vai comer doce? Gorda do jeito que está?”
“Não se olhou no espelho antes de sair? A maquiagem está ridícula!”
“Vai beber cerveja? Que coisa feia uma dama com um copo de cerveja!”
O que Pedro precisa saber é que desde de 29 de julho de 2021 esse tipo de comportamento passou a ser considerado CRIME. Até então, embora a violência psicológica já fosse considerada espécie de violência contra à mulher pela Lei Maria da Penha que neste mês de agosto comemora quinze anos, não havia previsão no Código Penal para a conduta.
O critério para a criação do tipo penal foi a preservação da integridade emocional da mulher, objetivando penalizar a quem lhe causar dano emocional “que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões” (trecho da redação da Lei 14.188/21).
O crime pode ocorrer por meio de ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularização, limitação do direito de ir e vir, desvalorização da mulher, humilhação pública, coação, controle de sua forma de vestir, isolamento do convívio social ou qualquer outro método. A pena é de reclusão de seis meses a dois anos e multa.
Além da multa, também pode ocorrer a prisão em flagrante, antes, somente decretada em caso de violência física, assim como também a decretação de medida protetiva, com o imediato afastamento do agressor psicológico.
O que enxergamos é um movimento dos Poderes e da sociedade no sentido de “fechar o cerco” em torno do agressor. Está cada vez mais difícil esquivar-se da punibilidade quando o assunto é agressão às mulheres e isso nos diz muito sobre a possibilidade de redução de feminicídio.
É que ninguém começa batendo. Há sinais muito sutis revestidos de falsos cuidados que apontam para possíveis agressões mais acentuadas. E foi com esse espírito que a lei tomou corpo. Com a consciência de que é no cercear , coagir, intimidar, provocar confusão mental, controlar o vestir, o falar, enfim, condutas dessa natureza que são revestidas de um sentimento de tornar a mulher objeto de sua propriedade e, quando o indivíduo tem a propriedade sobre algo, passa a poder fazer com “aquilo” o que quiser, inclusive, destruir.
O casal do início do texto é fictício, mas desafio quem já não viveu ou teve contato com situação parecida.