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Tribunais brasileiros reproduzem estereótipos de gênero em casos de violência sexual contra crianças e adolescentes

Dados de 2020 e 2021 do Fórum de Segurança Pública sobre Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes mostram que o estupro de vulnerável cresceu e que 61,3% do casos tem como vítimas meninas menores de 13 anos, por isso o grupo coordenado pela defensora pública escolheu para reescrita de decisão judicial sobre a perspectiva feminista o caso de estupro de uma adolescente, praticado no interior da sua residência, por seu padrasto. “Esse é um caso que reflete as pesquisas produzidas sobre violência sexual contra crianças e adolescentes, um caso padrão.”

A decisão judicial, objeto da reescrita de uma perspectiva feminista foi obtida a partir de banco de dados de processos judiciais envolvendo violência sexual, que compõe o projeto de pesquisa desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa Direito, Discriminação de Gênero e Igualdade, da PUC-SP. A pesquisa buscou entender como os tribunais brasileiros vinham julgando os casos de estupro no País e revelou argumentos utilizados pelos atores processuais, em especial os estereótipos relativos à vítima e ao acusado essa decisão. “É um caso padrão a defesa no processo. A defesa explorou a tese do desequilíbrio emocional da vítima, dizendo que ela (vítima) só teria narrado os fatos para a mãe no dia seguinte, supostamente por medo de ser coisa da sua cabeça.”

Para a pesquisadora, uma análise jurídica de uma perspectiva feminista tem que considerar a categoria gênero, romper com os estereótipos de gênero. Por isso, diz Mônica, na escrita foi feita uma análise cuidadosa de um laudo psicológico anexo ao processo e destacado  na reescrita que muitas vezes as vítimas de um estupro fica de fato confusas, apresentam dúvidas sobre o fato, ficam emocionalmente abaladas, tem sinais de trauma. “Isso é algo relevante, tem que ser considerado numa decisão judicial e foi reconsiderado na reescrita. Ao longo da análise do caso ficou evidenciado o desprezo o descrédito conferidos à palavra da vítima, que foi tida como  desequilibrada emocionalmente e rebelde, o que remonta à clássica histórica com relação as mulheres e loucura. A histórica condição de inferioridade da mulher, que acaba sendo construída a partir de variadas concepções, como mulher perigosa, vingativa, mesquinha, desequilibrada.”

Segundo Mônica todos esses estereótipos estão presentes ao longo do processo e reproduzidos nas mais diversas falas e  escritos e, também, na decisão judicial. “O passo de maior relevância na reescrita é justamente mostrar o quanto eles (estereótipos) estão presentes e que é possível fazer uma outra decisão judicial os enfrentando e os retirando. Isso é fundamental na utilização de uma metodologia feminista, que compreende perguntar pela mulher, identificar no processo as implicações e discriminações de gênero, que ficam ocultas, um direito supostamente neutro.”

Reportagem completa em  Jornal da USP

Foto: Freepik