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CONSUNI e NIPAM divulgam nota de repúdio ao ministro da Educação, Milton Ribeiro, depois de Aula Magna na UFPB

O Conselho Universitário (CONSUNI)  divulgou nota nesta sexta-feira (30), repudiando a fala do Ministro da Educação, Milton Ribeiro, durante uma Aula Magna realizada na Universidade Federal da Paraíba (UFPC). A nota destacou que a fala do ministro estimula a discriminação e a violência contra a comunidade LGBTQI+.

Diz a nota: “O Consuni vem declarar repúdio à fala proferida pelo ministro da Educação, Milton Ribeiro, em aula magna nesta universidade, por seu teor contrário à educação escolar sobre questões de gênero. Compreendemos que o ministro apresenta uma relação confusa entre gênero e sexualidade, reforçando estereótipos que levam o Brasil a ser um país marcado por registros de discriminação e violências contra a comunidade LGBTQI+.” A nota ainda aponta “desconhecimento e confusão conceitual altamente perigosas” para uma pessoa na posição de ministro.

Antes do CONSUNI, no dia 28, o Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Ação sobre Mulher e Relações de Sexo e Gênero (NIPAM) também emitiu carta de repúdio a Milton Ribeiro. Mais especificamente a um trecho da Aula Magna sobre os avanços e desafios da educação país onde o ministro se apresentou como pastou. Segue o trecho citado:

“Crianças com 9 anos, 10 anos, não sabem ler, sabem tudo, com respeito a todas essas senhoras aqui presentes, sabem até colocar uma camisinha, mas não sabem que b+a é ba. Estava na hora de dar um basta nisso e é por isso esse pessoal do contra me levou agora pro Tribunal de Contas da União porque eu não queria, eu retirei do edital do livro didático questões de gênero pra crianças de 6 a 10 anos. Onde já se viu… eu começar a discutir esses assuntos, não que eu sou contra a discussão desses assuntos, respeito a orientação de todos, mas eu acho que a gente não tem o dever… não tem o direito, melhor dizendo, de violar a inocência de uma criança, nessa idade de 6 a 10 anos, trazendo questões… se você quiser ser homem, você é homem, se quiser ser mulher, é mulher. A biologia, a natureza diz que ele é homem, é xy, mas eles querem dizer que a pessoa pode escolher o que quer. Não pode ser assim, eu acho que a gente tem de dar o direito… sim as pessoas têm liberdade pra escolher o que querem… então nesse ponto eu sou bem radical (…) eu acho que existe idade pra tudo e eu não permiti, e o melhor, o TCU por unanimidade me apoiou e disse que realmente não era hora de discutir esse assunto com crianças de 6 anos a 10 anos, que esse era um tema que não poderia estar no edital que eu lancei para livros didáticos e ponto final. Pago esse preço, pago sim, mas eu quero dar a minha contribuição com o futuro do Brasil”.

Na carta, o NIPAM foi taxativo e esclareceu:

“1) Crianças de 9 anos colocando camisinha, se é fato, indica violência sexual infantil, problemática infelizmente recorrente no interior dos lares, sendo que a escola tem sido a principal instituição de identificação, denúncia e encaminhamento de medidas protetivas dessas crianças.
2) Levantamento da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (ONDH) identifica que a violência sexual contra crianças e adolescentes acontece, em 73% dos casos, na casa das próprias vítimas ou dos suspeitos, mas, é cometida por pai ou padrasto em 40% das denúncias, sendo o suspeito do sexo masculino em 87% dos registros e, igualmente, de idade adulta, entre 25 e 40 anos, para 62% dos casos. A vítima é adolescente, entre 12 e 17 anos, do sexo feminino em 46% das denúncias recebidas (Publicado em 18/05/2020. Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos –
MMFDH).
3) Tratar de gênero não é necessariamente tratar de sexualidade, o que demonstra desconhecimento e confusão conceitual. O campo dos estudos de gênero e o campo dos estudos da sexualidade são interdisciplinares, complexos, relativamente autônomos e intercomplementares.
4) Questões de gênero são estudos acadêmicos e devem ser transversalizadas no currículo desde a educação infantil, porque “os princípios de visão e divisão de gênero” referem-se à ordem social e simbólica, além das identidades dos sujeitos. Como as relações de gênero são relações de poder, trata-se de superar a dominação masculina que impede o pleno desenvolvimento humano de crianças, mulheres e homens. Sobre isso há ampla literatura científica e  edagógica.
5) Os estudos e as políticas de gênero são reconhecidamente inovadores, além de eticamente desejáveis no contexto de planejamento e implementação das políticas públicas para transformação das relações sociais de opressão e pela erradicação da violência.
6) O Estado brasileiro está comprometido com a Agenda 2030 da ONU, que traz no ODS 5: alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas. Este compromisso e a assinatura de outras declarações resultantes de conferências da ONU implicam respostas concretas no âmbito das políticas públicas.
7) A UFPB assinou no dia 29 de novembro de 2017, através da Reitora Margareth Diniz, sua adesão à Campanha ElesPorElas, com a presença da representante da ONU Mulheres no Brasil, Dra. Nadine Gasman, integrando-se à rede global das universidades participantes da campanha. Seu foco é empoderar meninas e mulheres; e educar meninos e reeducar homens para masculinidades não violentas.”

A visita do ministro da Educação aconteceu na última segunda-feira (26). Na ocasião,  Ribeiro deixou claro que não vê educação como investimento, mas como custo. Ele não anunciou qualquer liberação de recursos para a Universidade, apenas tentou justificar os cortes feitos na área da educação e disse que o governo precisou escolher entre o investimento em pesquisa ou colocar comida na mesa de brasileiros.

Leia a carta do CONSUNI na íntegra.

Se referindo à “oposição” que criticou a retirada do tema de gênero de livros didáticos direcionados a crianças entre 6 e 10 anos, o ministro argumentou que a crítica à exclusão do tema aconteceu porque queriam incentivar a livre opção sexual. O ministro disse que “se você quiser ser homem, você é homem, se quiser mulher, é mulher. A biologia, a natureza diz que ele é homem, é XY, mas eles querem dizer que a pessoa pode escolher o que quer. Não pode ser assim”. Compreendemos que questões de gênero não tratam necessariamente de sexualidade, o que demonstra, pelo ministro, desconhecimento e confusão conceitual, altamente perigosas para uma pessoa na posição de liderança do Ministério da Educação.

A frase confunde livros que incentivam o respeito à diversidade com uma ideologia obtusa que diz que, ao conhecer opções de gênero diversas as crianças serão levadas a algum “descaminho”. Esse não é um diálogo secundário. Segundo nota apresentada a este Conselho pelo NIPAM – Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Ação sobre Mulher e Relações de Sexo e Gênero da UFPB, “questões de gênero são baseadas em estudos acadêmicos que devem ser transversalizadas no currículo desde a educação infantil, porque ‘os princípios de visão e divisão de gênero’ referem-se à ordem social e simbólica, além das identidades dos sujeitos.

O Consuni ratifica as informações do NIPAM de que “relações de gênero são relações de poder”. Trata-se de superar a dominação heteronormativa masculina que impede o pleno desenvolvimento humano de crianças, mulheres e homens, no que temos ampla literatura científica e pedagógica no Brasil e no mundo.

O Estado brasileiro está comprometido com a Agenda 2030 da ONU, que traz no ODS 5: alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas. Este compromisso e a assinatura de outras declarações resultantes de conferências da ONU implicam respostas concretas no âmbito das políticas públicas.

A UFPB assinou no dia 29 de novembro de 2017, através da Reitora Margareth Diniz, sua adesão à Campanha ElesPorElas, com a presença da representante da ONU Mulheres no Brasil, Dra. Nadine Gasman, integrando-se à rede global das universidades participantes da campanha. Seu foco é empoderar meninas e mulheres; e educar meninos e reeducar homens para masculinidades não violentas.

Compreendemos, portanto, que se faz urgente uma posição ativa deste Consuni contra uma fala que promove o silenciamento à educação sobre questões de gênero e reiteramos o repúdio a uma aula magna que promove a discriminação e reitera a realidade de ideológica de oposição a políticas mundiais que promovem a igualdade e o respeito à diversidade de gênero.